A representatividade da criança negra é muito pequena na publicidade infantil, segundo dados da pesquisa Todxs, realizada pela ONU Mulheres. “Eu quis trazer esse dado porque achei muito grave. Quando a gente fala de publicidade para criança a gente tem uma ausência de raça negra. Praticamente os negros não aparecem”, disse Isabel Aquino, consultora técnica da ONU Mulheres, durante o Impact Brasil 2022.
Os dados estão na décima onda da pesquisa, realizada desde 2015, que analisa peças publicitárias para fazer o mapa da representatividade na publicidade brasileira. A amostra contempla mais de 5 mil peças de 425 anunciantes, em 35 segmentos diferentes.
A respeito da publicidade infantil, o levantamento mostrou que o protagonista dessas campanhas é, em 55% dos casos, o produto; 13% o homem; e 11% a mulher. Quando o protagonista é masculino, 61% são de várias etnias, 33% de brancos e 7% de negros. Já no caso do protagonismo feminino, 73% são brancas, 27% de várias etnias e não há protagonista negra.
Para fazer a pesquisa, foi desenvolvido um glossário para possibilitar a classificação entre campanhas que estereotipam ou que empoderam os protagonistas.
Ainda no caso das campanhas para as crianças, os estereótipos aparecem na figura da mãe, especialista, nos cuidados com a família, na força física nos meninos e homens e nas profissões estereotipadas. Por outro lado, as crianças são empoderadas sendo sujeitos da situação, com respeito e posição de poder, por meio das profissões.
De acordo com o estudo, na publicidade em geral, as mulheres estão sendo estereotipadas com padrão de beleza, com ausência de diversidade racial, sendo mãe, tendo cuidados com a família e sendo especialista em algo que se espera delas. Já os homens estão sendo estereotipados como especialistas no que se espera deles, com posições de poder, em profissões tipicamente masculinas, idiotizados e com ausência de diversidade racial.
Por outro lado, também há publicidade que empodera. O empoderamento está sendo dado às mulheres, de acordo com a pesquisa, quando elas são mostradas como sujeito da situação, com liberdade de escolha, com auto-estima, sendo especialista em algo que não se espera e com força física. E os homens estão sendo empoderados como sujeitos da situação, especialistas em algo que não se espera deles, com liberdade de escolha, nos cuidados com o lar e com auto-estima.
Isabel iniciou a apresentação definindo o que é estereótipo e quais são os pontos negativos de usá-los para interpretar a sociedade. “O estereótipo é uma espécie de atalho que a nossa mente usa para decodificar as coisas que a gente está vendo. Ele não necessariamente é 100% verdade, tampouco 100% mentira. O que acontece é que eles acabam se tornando padrões que a sociedade constrói e o pior do estereótipo é porque ele cria imagens fixas e muito simplificadas da forma como a gente lê o mundo, ele é muito reducionista”, disse.
Para conseguir vencer esse desafio, empresas precisam investir em um time diverso para que, na hora da criação das campanhas, os estereótipos não predominem. “A partir do momento em que eu coloco diversas pessoas diferentes em volta de uma mesa, em uma equipe de trabalho, eu tenho ali uma múltipla perspectiva das situações. Então a chance de eu encontrar soluções mais originais para os problemas aumenta. Isso é muito bom para o business. Tem uma pesquisa da McKinsey que fala que negócios com equipes diversas lucram 33% mais que empresas com equipes homogêneas e alavanca performance: equipes mais criativas, inovadoras, resilientes e motivadas. As pessoas se sentem mais à vontade para falar sua opinião numa reunião”, explicou a executiva.
A pesquisa mostrou que o protagonismo nas campanhas é, na maior parte das vezes, do produto (41%), seguido por mulheres (25%) e homens (20%). “Quando a gente olha a raça, a coisa vai ficando complicada. 74% dos homens protagonistas são brancos e 62% das mulheres protagonistas são brancas. Só quando eu tenho comerciais onde eu tenho várias pessoas protagonistas, é que eu tenho o mix da diversidade feito. Será que isso não é diversidade estereotipada? Ou a pasteurização da diversidade?”, questionou Isabel.
A executiva pontuou que houve uma evolução, já que 27% de negras como protagonistas de comerciais é o maior índice já registrado pela pesquisa, mas destacou que essa porcentagem está em torno dos 20% há bastante tempo.
A falta de representatividade é ainda maior em outra parcela da população. O público LGBTQIAP+ não esteve representado em nenhuma das campanhas analisadas e os PCDs estavam em apenas 1,2% das peças. “A publicidade evoluiu muito nos últimos anos, mas hoje a gente vê uma desaceleração desse progresso. A publicidade ainda é racista. A maioria das marcas ainda não se posiciona. Muitos anunciantes classificados como neutros. A gente está mostrando um único tipo de beleza”, falou.
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