Chegar ao C-Level, por si, já é algo emblemático na carreira de qualquer profissional. Levar a nomenclatura de CMO, em função de toda a exposição típica da área, tem contornos diferentes e uma mítica atrelada ao cargo, no Brasil e no mundo. E tem sido assim com a carreira de Daniela Cachich. Desde 2016 na PepsiCo, Cachich já liderou áreas distintas relacionadas ao marketing e à comunicação na Unilever e Heineken, todas elas, empresas de legado. Desde esta segunda-feira, 9, é, oficialmente, a presidente da Future Beverages, área da Ambev dedicada a alcoólicos com exceção de cerveja.
“Então CMO da PepsiCo, Daniela Cachic acaba de assumir a presidência da Future Beverages, área da Ambev responsável pelo portfólio de alcoólicos, com exceção de cerveja”
Várias vezes reconhecida como melhor CMO do Brasil, em listas diversas, o movimento de Cachich não foi óbvio. Seria natural esperar que a executiva assumisse a posição equivalente em outra companhia, o que se tornou convencional nas últimas décadas para lideranças de marketing. No entanto, o anúncio a coloca como lider de uma área nova, cujo objetivo é desenvolver produtos com base em inovação e ampliar a participação daquilo que não é o core da companhia. O movimento de Cachich, somado a alguns outros recentes ilustra o que é próprio das mudanças vividas no papel de um CMO: não é mais sobre marketing, mas também sobre negócios, tecnologia e transformação.
Em janeiro deste ano, Ariel Grunkraut, então VP de marketing e vendas do Burger King Brasil, se tornou CMTO, adicionando na conta a responsabilidade sobre a área de tecnologia. Neste caso, um movimento interno, mas também representativo, pois, se antes era discutida a interlocução do marketing com a tecnologia, casos como o do Burger King mostram que a relação é indissociável. Em abril, dentro do mesmo grupo, Fernando Machado, CMO da holding responsável por Burger King, Popeyes e Tim Hortons, trocou o mundo do fast-food pelo dos games, assumindo o marketing da Activision Blizzard, uma das maiores desenvolvedoras de games do mundo. A mesma cadeira, mas em indústrias absolutamente diferentes. Vale lembrar, Machado também veio da Unilever.
No final de julho, Luciana Feres, VP global de marketing da Danone, deixou Paris para assumir a posição na Descomplica, startup de educação que recebeu aporte recente de R$ 450 milhões. Em outros casos, os líderes de marketing já adicionam em suas funções o growth, é o caso, por exemplo de Gustavo Aguiar, head de growth e marketing da 99 e de Sandra Montes que, na semana passada, se tornou CMO do Rappi, mas antes disso, respondia pelo marketing e growth da 99. E os casos são inúmeros.
Leia também: O que o mundo dos games busca nos CMOs tradicionais?
Em um mundo onde martech, growth, CX, UX e tantas outras disciplinas potencializaram o papel das lideranças de marketing, movimentos como o de Daniela Cachich e de todos os outros, mencionados ou não aqui, reforçam que, nos próximos anos, assistiremos situações cada vez menos óbvias envolvendo o marketing. Seja nas áreas de transformação digital, inovação ou digitalização ou aquilo que ainda está por surgir. A existência dessa figura, o CMO, já esteve em xeque por várias vezes. Em determinando momento, apontavam a perda de interlocução com o alto escalão. Em outros, voltou-se a discutir a retomada de sua força estratégica. Recentemente, se tornou um aliado direto da transformação digital. De agora em diante, porém fica cada vez mais difícil discutir seu papel, pois CMO é uma alcunha em mutação.
“Em um mundo onde martech, growth, CX, UX e tantos outros termos potencializaram o papel das lideranças de marketing, movimentos como o de Daniela Cachic apenas reforçam que, nos próximos anos, assistiremos situações cada vez menos óbvias envolvendo o marketing”
O mais importante, no entanto, é considerar os pontos em comum do que a Ambev viu em Daniela Cachich. O que a Activision em Fernando Machado, o Burger King do Brasil na nova posição de Ariel ou a Descomplica em Luciana: foco em jornada e conversão, conexão entre propósito e inclusão, as inúmeras ferramentas de martech sob gestão e camadas cada vez mais intensas de ciência naquilo que, por muito tempo, esteve muito mais do lado da arte.
Pesquisa da Gartner, divulgada em janeiro deste ano, mostrou esse contexto em números. De um grupo de CMOs globais consultados, 73% relataram que precisaram otimizar a dinâmica com clientes já existentes para impulsionar o crescimento no desafiador ano de 2021. Além disso, o estudo também mostrou que, para 39% dos CMOs, era vital a premissa de aumentar as vendas de produtos existentes e outros 34% iriam apresentar novos lançamentos neste 2021. Ou seja, o velho marketing como o conhecemos segue sendo sobre mercado, mas agora, com os superpoderes da tecnologia e das novas dinâmicas de gestão e negócios.